Não Afunde Os Outros Hoje, Para Que Eles Não Afogarem Você Amanhã

Dr. Michael LaitmanEu passei a minha vida inteira cuidando de mim mesmo, tanto interna e instintivamente, quanto conscientemente, intencionalmente e deliberadamente. Neste caso, como eu faço para mudar completamente a minha natureza? Como posso aprender a amar o próximo? Afinal, amar o próximo significa pensar apenas nele, colocar todo o meu corpo ao seu serviço, todos os meus meios, habilidades e geralmente tudo o que eu tenho. E fazer isso a tal ponto que não vou ter nada exceto esse ponto do desejo de doar para ele e implacavelmente cuidar dele para que ele se sinta tão bem quanto possível.

É assim que uma mãe cuida de seu filho. A própria Natureza a dirige incansavelmente para cuidar da criança, e a única coisa que lhe interessa na vida é que esses quilos de carne se sintam bem. Ela só pensa em como arrumá-lo confortavelmente, com que alimentá-lo, quando mudar a fralda, e no geral, o que fazer com ele para que ele se sinta ainda melhor. Não existe outro cuidado para ela.

Como podemos seguir o seu exemplo para que possamos tratar toda a humanidade da mesma maneira, com a mesma devoção? Isso é impraticável!

Mas, poderia a Natureza realmente definir condições impossíveis diante de nós? Por que, então, chegamos a um estado completamente oposto? Por que estamos totalmente imersos no interesse próprio? Além disso, embora os animais constantemente também se preocupem consigo mesmos, as pessoas, além disso, querem lucrar à custa dos outros, usá-los, impor seu poder e opiniões sobre eles, dobrá-los à sua vontade. Uma pessoa se deleita em se elevar sobre os outros. Além disso, ela gosta quando se sentem um pouco pior do que ela, quando ela está num estado mais vantajoso em relação a eles. Uma pessoa avalia constantemente a si própria em relação àqueles em torno dela, e só através disso é que ela estabelece a extensão da sua satisfação.

Se o egoísmo me levou ao ponto onde me sinto acima de todos e onde preciso deles somente para sentir a minha superioridade, como posso mudar essa natureza e mudar para um estado oposto? Talvez seja vantajoso para eu imaginar uma situação utópica em que me preocupo com meu próximo e recebo prazer disso, como uma mãe que cuida de seu bebê? Suponha que eu amasse os outros da mesma forma que ela faz e gostasse de estar constantemente cuidando deles, então, talvez, eu sentiria absoluta realização pessoal com isso?

No entanto, não vejo qualquer meio para conseguir isso. O que me obrigaria a isso?

Na verdade, a humanidade ponderou isso por milhares de anos. Ao longo da história, muitos livros foram escritos, muitas tentativas foram feitas para implantar algo semelhante: construir um bom ambiente, formar organizações correspondentes. Mesmo centenas de anos atrás, os utopistas tentaram criar as condições para as boas e afáveis relações entre as pessoas em diferentes cantos do mundo. No entanto, eles não tiveram sucesso na implantação dessas iniciativas.

No curso de nosso desenvolvimento, estamos nos tornando mais inteligentes e conhecendo a natureza humana cada vez melhor, e agora entendemos que somos incapazes de nos levantar acima da nossa própria natureza. Talvez seja mesmo uma coisa boa. Talvez isso nos dê algo especial. Mas, a construção de tal sociedade é impossível: uma ideia utópica, de fato.

É por isso que em nossas sociedades nos limitamos às leis de conduta, de modo a não prejudicar muito o nosso próximo. Nós temos advogados, contadores, sociólogos, psicólogos, políticos, e assim por diante, e eles padronizam as leis sociais. Nós nos unimos com os outros, mas apenas a fim de receber serviços. Por exemplo, um município se preocupa com a ordem na cidade, com a limpeza do lixo e outros serviços, como creches, escolas, centros culturais e assim por diante. Nós estamos dispostos a contar com as necessidades de todos e, neste caso, vale a pena nos unir. Afinal, graças a isso cada um paga uma quantia relativamente pequena para uma ampla gama de serviços. Essas coisas são claras para nós, pois através delas recebemos um benefício real, calculável.

Mas, quando se trata de mudar as atitudes das pessoas no reino dos sentimentos e emoções, de modo que a pessoa leve em consideração o seu próximo ao invés de ouvir seu próprio coração, isso é algo que não podemos fazer.

E aqui chegamos a um entendimento do estado especial da crise que estamos hoje. É uma crise muito estranha, e em sua essência, ela pertence às relações entre nós. Usando todas as mesmas formações egoístas já tentadas, buscou-se construir uma sociedade mais confortável para todos, tendo em conta os interesses comuns de uma forma ou de outra. Nós entendemos que um excesso de pessoas descontentes vai levar a confrontos e conflitos irreconciliáveis, e isso ameaça provocar guerras civis. Ao longo de todas as épocas, temos tido conhecimento de que o nosso egoísmo precisa ser bem refreado para que não nos devoremos uns aos outros.

No entanto, todos esses cálculos foram construídos sob um “guarda-chuva egoísta”: Nós entendemos que essa é a nossa natureza e que temos de nos conter dentro de certos limites. Mesmo que nosso mundo brilhe com facetas egoístas, ele ainda requer um mecanismo único, a fim de evitar os surtos que ameaçam destruir todas as nossas realizações. Foi assim que a humanidade chegou a criar o Banco Mundial, a ONU e outras organizações internacionais, e como chegamos a uma maior comunicação e a contabilidade mais completa de interesses.

Em particular, durante o último século percebemos que é necessário levar mais em consideração o outro. As duas guerras mundiais mostraram-nos que ninguém ganha na guerra desenfreada, pelo contrário, todo mundo sofre uma perda como resultado, e todo mundo paga um preço caro por isso.

É por isso que a humanidade criou todos os tipos de comunidades e canais de comunicação. Há ainda “botões vermelhos” em Moscou e Washington para o estabelecimento de contato de emergência em caso de uma ameaça global. Existe certa forma de confiança aqui simplesmente porque está claro para todas as partes envolvidas que ninguém sairia de um conflito incólume e proveitosamente. Assim, percebendo que não há alternativa, armados com uma base acumulada, podemos agora estabelecer certas interações e comunicação.

Por um lado, essa ainda é uma abordagem egoísta, mas por outro lado, tal processo ainda leva à proximidade entre nós. Mesmo que cada vez mais nós nos odiemos e queiramos matar os outros, está se tornando claro que eles são tão fortes, e, portanto, é vantajoso levarmos o outro em consideração.

De KabTV “Uma Nova Vida” #13, 11/01/12